domingo, 19 de setembro de 2010

1.

Há algo que me transcende neste avançar
de memória curta     como se fosse um recategorizar
tanto de cá como de lá    dois sujeitos plurais    nós e eles
sinto dos atalhos a dissimetria entre o desagrado
de gestos — atitude do léxico mental — que promovem
estímulo — de entre «eu»/eu e «tu»/eu na simples divisória
que aponta o chão    como espada de Gabriel
flamejante — das águas que são o lanço dum tempo.

Rasteja pelo deserto o momento     carrega
o veneno da vida     deslocação-instante cai ali
num oásis deitado       convidou — à prova-realidade
aprisionadas no «tu»/eu — areias e águas.

Lamúrias de um desequilíbrio biótopo
percorrem o ar da manhã junto às orelhas o fogo
dispo a camisa das palavras e atiro-as nuas à rua
como chuva no relógio da torre junto ao cemitério
uma voz que ignora o diálogo das campas cobertas
de flores e velas      sinto o lamento
e não conheço a linguagem bipatente
entre as flores e as jarras, o fogo e a cera.
Se fosse bipartível, falaria as duas faces:
uma morta, outra viva. E não contaria a ninguém
das histórias que ouvisse quando os ossos carregassem
a longa passagem do tempo.



2.
Há vezes em que entro a falar-só
e sinto a Natureza   que fala com todos
afagar-me os cabelos com mãos de brisa
penetra-me até aos ossos (estremeço)
o peso dessa linguagem desconhecida.

Há vezes em que não resolvo
a simples equação de existir
sem voz — ou com ela presa nas asas
onde profundam sons no lanço dum tempo.

JFráguas – No lanço de um tempo, 08.12.2009.

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